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ITBI: Decisão do Supremo incentiva contratos de gaveta

Por unanimidade, em análise de recurso extraordinário, o STF – Supremo Tribunal Federal – reafirmou que a cobrança de ITBI – Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) só é possível após transferência efetiva da propriedade imobiliária, mediante o registro.

O recurso foi interposto pelo município de São Paulo contra uma decisão do Tribunal de Justiça paulista (TJ-SP) que considerou ilegal a cobrança do ITBI diante da cessão de direitos de compromisso de compra e venda de imóvel, firmado entre particulares. O município alega que o compromisso de compra e venda é um negócio intermediário entre o compromisso em si (negócio originário) e a venda a um terceiro comprador (negócio posterior) e que, de acordo com a Constituição Federal (artigo 156, inciso II), o registro em cartório é irrelevante para a incidência do imposto.

Segundo observou o relator do recurso, o presidente do STF, ministro Luiz Fux, o entendimento do TJ-SP está em sintonia com a jurisprudência do Supremo e apontou diversas decisões, colegiadas e monocráticas, nas quais a exigência do ITBI ocorre com a transferência efetiva da propriedade, mediante registro imobiliário, e não na cessão de direitos, visto que não se admite a incidência do tributo sobre bens que não tenham sido transmitidos. O presidente da corte ressaltou que a medida previne tanto o recebimento de novos recursos extraordinários como o debate desnecessário sobre recursos idênticos.

Assim, a decisão do STF pacificou o entendimento de que o ITBI só deve ser exigido no registro do imóvel em cartório, estimulando assim práticas adotadas para adiar o recolhimento do tributo, como o chamado “contrato de gaveta” – documento informal de compra e venda. Porém, segundo alertam especialistas na área, esta medida pode trazer riscos.

Prefeituras, como a de São Paulo, vinham cobrando o ITBI em fase anterior ao registro. Como nos casos em que, para ter maior segurança, o comprador formalizava em cartório um contrato desse tipo, por meio de uma escritura pública de promessa de compra e venda. Nessa situação, o imóvel permanece no nome do vendedor até o pagamento total. É uma garantia para o comprador, pois se o vendedor vier a falecer e o preço for quitado, os herdeiros são obrigados a transmitir a propriedade sem incluí-lo no inventário.

A discussão é pertinente, visto que o recolhimento do ITBI recai aos compradores dos imóveis. Em São Paulo e Brasília, por exemplo, a alíquota é de 3% do valor venal do bem. No Rio de Janeiro, de 2%. “O efeito prático dessa decisão se aplica para quaisquer outras discussões, como o contrato de promessa de compra e venda. É super comum as prefeituras exigirem nesse momento”, diz Bruno Sigaud, do Sigaud Advogados. Em São Paulo, por exemplo, a prefeitura cobra o ITBI tanto no contrato de promessa de compra e venda quanto no de cessão de direitos de compra e venda.

Segundo Bruno Sigaud, há riscos com o contrato de gaveta, mas cada situação deve ser analisada. Por exemplo: No caso de compra de imóvel na planta, no qual o proprietário mantém a escritura no nome da incorporadora e, anos depois, somente na hora de vender, passa a titularidade para o nome do adquirente, gerando o pagamento do ITBI. Segundo ele, nesses casos, não há grandes riscos: “Como os empreendimentos são individualizados, uma eventual dívida da incorporadora dificilmente recairia sobre o novo proprietário.”

Porém, para aqueles que compram imóveis de terceiros o contrato de gaveta não é recomendado, pois diante de uma eventual dívida do antigo proprietário, o imóvel pode ser penhorado. Já no caso dos inventários, os herdeiros também podem fazer um contrato de cessão de direitos, adiando o pagamento do ITBI. A decisão do Supremo também impacta os leilões de imóveis. Nestes casos, a prefeitura de SP concedia prazo de 15 dias após a venda para que o imposto fosse quitado e agora, só poderá exigir mediante o registro do imóvel. Diante da publicação do acórdão do STF, a Prefeitura de São Paulo afirma que irá avaliar as consequências e definir eventuais medidas cabíveis.

Advogado da área imobiliária, Luís Rodrigo Almeida, sócio do Dib, Almeida, Laguna e Manssur Sociedade de Advogados, também acredita que com a tese ampla as prefeituras não podem cobrar ITBI em nenhum momento antes do registro do imóvel, que é quando há realmente a transferência de propriedade. No caso que o STF analisou, afirma, a cobrança é ainda mais absurda. “O casal comprou um imóvel na planta e transferiu para terceiros, nenhum dos dois ainda são proprietários”, diz. Para ele, contudo, o risco de uma eventual penhora de terceiros, com contrato de gaveta, “não vale mais do que qualquer economia na postergação do imposto”.

Juridicamente, o contrato de gaveta é válido, segundo o advogado da área de contratos e cível, Luis Cascaldi, do Martinelli Advogados. Ele tem obrigações e deveres para quem tem a intenção de comprar e vender. Porém, como nem sempre é um contrato público, registrado em cartório, o proprietário do imóvel, para todos os efeitos, é quem consta na escritura, por isso há risco. Se o novo proprietário informal não quitar as taxas ou o condomínio, tudo pode ser cobrado do antigo proprietário.

Já para o presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Luiz Antonio França, a decisão do Supremo foi correta ao dizer que incide o ITBI apenas no registro do imóvel. “Não se pode pagar o imposto apenas numa intenção”, afirma. Já com relação ao contrato de gaveta, França afirma que ninguém quer viver com nada irregular, sem estar devidamente no seu nome, e “pagar o imposto faz parte do negócio”.

Fonte: Valor Econômico